Compras Coletivas: uma boa opção para o seu negócio?
O formato de compras coletivas se disseminou rapidamente pela internet brasileira. Este formato de compras foi criado em 2008 nos EUA e chegou ao Brasil em 2010. A sistemática é simples: um canal de compras coletivas negocia juntamente a uma empresa um desconto (em geral de 40% a 90%) para uma compra única de dezenas, centenas ou mesmo milhares de unidades de certo produto ou de utilizações para determinado serviço.
Para o consumidor essa é uma excelente alternativa. Mas e para as empresas que assumem um grande desconto para um grande número de consumidores esse é um bom negócio? Essa resposta é mais complexa do que parece.
É interessante percebermos que o ano da criação do Groupon, primeiro site do gênero nos Estados Unidos, é justamente o ano em que foi desencadeada uma grande crise financeira no país e posteriormente no mundo. Como o poder de compra dos americanos diminuiu drasticamente naquele ano e as empresas passaram a ter excedentes de estoques ou mesmo uma diminuição drástica na demanda pela prestação de seus serviços, não há dúvidas de que o formato de compras coletivas foi uma excelente opção para consumidores e vendedores.
Então o primeiro ponto a analisarmos é: as compras coletivas surgiram em uma crise financeira, em meio à falência de milhares de empresas e ao baixo poder de compra dos consumidores.
E no Brasil?
No Brasil nosso pioneiro foi o Peixe Urbano. O site chegou a contar com mais de 1 milhão de usuários cadastrados que usufruiram dos descontos negociados pelo site. Nesse modelo usualmente vemos estéticas, restaurantes e alguns hotéis oferecendo descontos para compras coletivas com um mínimo de compradores definido que, quando alcançado, torna efetiva a compra para todos os usuários interessados.
As compras em sites e aplicativos de compras coletivas geralmente são feitas por impulso. Por tratar-se de ofertas diárias, ou o comprador adquire naquele dia vale para o produto/serviço ou perde a promoção. Isso traz uma realidade interessante sobre as compras coletivas: estima-se que 30% dos vales não sejam utilizados. O comprador perde, esquece ou simplesmente não utiliza este vale no tempo determinado da promoção (em geral 60 dias).
Segundo ponto a analisar: os consumidores de compras coletivas são consumidores de ocasião.
Quando você entra em contato com um dos sites ou aplicativos de compras coletivas percebe que o argumento de vendas do espaço no site é “publicidade para o seu negócio”. Mas é interessante perceber a falsa ideia de publicidade gratuita que esses sites proporcionam.
Afinal, quanto custa essa publicidade?
Os contratos feitos no Brasil basicamente seguem a seguinte linha:
- A empresa interessada oferece um desconto muito atrativo (em média 50%)
- O site fica com 50% do valor de venda definido
- O valor das vendas dos vales não utilizados fica para o site
Vamos colocar isso em uma planilha:
Pelos valores acima descritos, o investimento em “publicidade” é alto. E é importante reforçarmos que nossos clientes-alvo são de ocasião, o que faz com que o cliente dificilmente volte a consumir da sua marca, a menos que fique positivamente impressionado com seu produto ou serviço. Seu diferencial é a qualidade ou seus produtos/serviços estão na média ou mesmo são inferiores aos produtos/serviços encontrados no mercado?
Analise a tabela acima. No caso de 1000 vendas (o que não é um fato extraordinário nesse tipo de compra) o site que promove sua venda está ganhando uma comissão de R$ 32.500. Você tem noção de quantos anúncios você faz com esse valor? Vamos trazer uma situação rotineira de publicidade online: Você resolveu investir em uma ferramenta online no formato PPC (Pay Per Clic), isso é, você paga cada vez que um interessado clicar no seu anúncio e for remetido ao seu site.
Com um custo médio de R$ 0,60 por visualização do seu anúncio, um investimento de R$ 32.500 permite que 54.167 pessoas visitem o seu site. O retorno sobre esse investimento em novos clientes, pagando o preço justo pela sua mercadoria/serviço, não é mais interessante que uma venda simples para consumidores atraídos pelo baixo preço de seu produto/serviço?
Terceiro ponto de análise: que tipo de publicidade é mais interessante para o seu negócio?
Ainda existe um fator muito importante para sua análise: sua empresa tem capacidade para entregar o produto/serviço para 1000 pessoas em um curto período de tempo? São famosos os casos de pizzarias que vendem vales para tele entregas e não conseguem atender a avalanche de pedidos oriundos dessa compra coletiva. E mais: os clientes habituais da pizzaria não conseguem ter seus pedidos atendidos também, o que gera uma quebra de confiança nestes em relação à empresa. Portanto uma compra coletiva pode ter um alto risco e causar um grande transtorno em sua operação, assim como na rentabilidade de seu negócio.
Quando o empresário recebe a proposta de compra de 1000 unidades em uma única negociação, é claro que sua primeira reação vai ser o entusiasmo. Mas sua empresa pode entregar o que está vendendo? Qual o custo para sua imagem perante seus atuais consumidores e perante os consumidores de ocasião se sua empresa não puder cumprir o que foi contratado?
Outro exemplo verídico: um restaurante com 20 mesas vendeu mais de 800 fondues em um site de compras coletivas sem exigir agendamento prévio para utilização do vale. Uma multidão de consumidores furiosos depredou o restaurante por não conseguir utilizar o vale pela falta de estrutura do local. Qual o efeito disso na sua marca?
Quarto ponto de análise: Sua empresa pode entregar o que está vendendo?
Por tudo que foi apresentado, você deve estar pensando agora que a compra coletiva é maléfica para o seu negócio. Também não é essa a realidade, mas fiz a apresentação destes 4 pontos de análise iniciais para que sua visão seja a mais crítica possível a respeito dessa questão. Afinal, uma venda coletiva mal planejada pode quebrar o seu negócio.
Agora vamos trabalhar em outra ótica: as vendas coletivas podem ser uma solução para suas dificuldades? Neste momento vou abordar 2 vertentes: Produtos e Serviços.
Vendas Coletivas para quem trabalha com Produtos
Quem trabalha com produtos deve estar muito atento à questão margem de lucro. Em uma venda coletiva sua empresa estará praticamente abdicando de qualquer lucro e, ocasionalmente, assumindo prejuízos.
Vou trabalhar com o exemplo da planilha acima: você pode perceber que sua receita a cada produto vendido é de 25% do preço inicial dele. Portanto, ou a sua margem de lucro é superior a 400% sobre cada item ou você está tendo prejuízo na negociação coletiva. E não imagine que fazendo essa venda coletiva você obterá ganhos em relação à imagem de sua empresa que lhe renderão novos clientes no futuro, pois como apresentamos anteriormente, esses são clientes de ocasião. Mais uma vez: seu produto pode impressionar esses consumidores de forma a fazê-los repetir a compra pelo preço padrão de vendas dos seus produtos?
Entretanto, existem estágios de vida de cada produto. Introdução no mercado, crescimento, maturidade, declínio e extinção. Se sua empresa revende acessórios específicos para certos modelos de celulares e está com um grande estoque de versões defasadas tecnologicamente (o ciclo de vida de um celular antes de entrar em declínio é de 10 meses), com baixíssima demanda, a venda coletiva pode ser uma solução. Imagine se você vendesse máquinas de escrever no final do ciclo de vida deste produto. Que tal se desfazer deste estoque a um preço vil em vez de permanecer com ele até virar sucata?
Análise de Produtos: qual o ponto do ciclo de vida do produto que você quer negociar em uma venda coletiva?
O fator fundamental para a venda coletiva de produtos é aumentar o capital de giro. Reveja o primeiro ponto de análise deste artigo (as compras coletivas surgiram em uma crise): empresas em crise de recursos de curto prazo podem se utilizar de compras coletivas. Digamos que sua empresa adquiriu um bem de alto custo e está finalizando seu pagamento. Por algum motivo você não fez um bom planejamento de fluxo de caixa, o que deixou sua empresa no vermelho neste mês e sem crédito disponível em bancos. Você sabe que no próximo mês existem diversas receitas a realizar com vendas à prazo e que será finalizado o financiamento do bem adquirido. Mas neste mês será difícil inclusive o pagamento dos salários dos seus funcionários. A venda coletiva é uma forma de renovar seus recursos de curto prazo, mesmo que você venda seus produtos abaixo do ponto de equilíbrio. Se desfazendo de parte do estoque sua empresa estará recapitalizada.
Outro exemplo: sua empresa vende beliches de uma marca desconhecida e possui um grande estoque. Você teve uma excelente proposta de mudança de rumos, passando a vender exclusivamente beliches de uma grande marca. O que fazer com o estoque?
Análise de Serviços (I): Vendas Coletivas para quem trabalha com Serviços
Para quem trabalha com serviços a equação é muito diferente. Em serviços, o tempo ocioso é custoso para a empresa. Uma mesa desocupada em um restaurante é custo, um horário vago na agenda de um pintor é custo, um horário vago para banho e tosa sem ocupação em um pet shop é custo, etc.
Se tempo ocioso é custo, é lógico que a área de serviços seja a maior cliente dos sites de compras coletivas. Se um bar de sinuca tem uma baixíssima utilização de suas mesas em segundas-feiras, este pode optar por vender horas (ou fichas) via um site de compras coletivas para serem utilizados exclusivamente nas segundas. O segredo está aqui: você empresário define as regras de utilização dos vales em seu estabelecimento. No caso do bar de sinuca, você pode optar por um desconto agressivo a ser utilizado em um dia da semana de baixo movimento, visando não simplesmente o lucro com a utilização das mesas, mas sim o lucro com a comercialização de bebidas nesses dias.
Outra regra interessante a ser utilizada conforme o caso: exija o agendamento prévio para utilização dos vale-compras adquiridos via site de compras coletivas.
Análise de Serviços (II): estude e defina as melhores regras para seu negócio
Restaurantes utilizam as vendas coletivas como forma de conquistar clientes em épocas de baixa temporada. Cursos de inglês estão fornecendo algumas aulas com desconto para que o cliente conheça melhor sua metodologia antes de contratar o serviço. Cursos online estão sendo disponibilizados com desconto. Enfim, a venda coletiva pode ser uma excelente opção para diminuir os efeitos da sazonalidade em seu negócio. Um modelo de vendas coletivas mais moderno são os lançamentos de produtos e serviços.
Outro fator muito interessante é percebido quando serviços de maior valor são contratados nessa sistemática. Quem compra um pacote de uma semana em um resort no nordeste na época de baixa temporada com certeza pode ser um potencial divulgador da qualidade de seus serviços. Mais uma vez: as empresas que conseguem encantar seus clientes com serviços de alta qualidade têm excelentes possibilidades de atrair estes clientes a repetir a experiência, assim como os conquistar novos clientes por estes indicados.
Trabalhar ou não com o mercado de compras coletivas?
Enfim, o mercado de compras coletivas é uma realidade a se considerar dentro das estratégias possíveis para o seu negócio. Seja via sites e e aplicativos, seja via lançamentos digitais, não se pode mais negar o poder de vendas que este mercado proporciona.
O que é fundamental para que sua empresa atue neste mercado é o planejamento. Como exposto, a venda coletiva pode ser de grande valia para sua empresa, assim como pode decretar inclusive a falência de seu negócio quando mal executada.
No mercado de compras coletivas é possível encontrar alguma flexibilidade nas comissões cobradas, assim como quanto às receitas dos vales não utilizados pelos compradores. É muito importante negociar a venda de seus produtos e serviços via estes sites e aplicativos, assim como analisar atentamente os contratos propostos.
E lembre-se: se sua empresa não possui diferenciais suficientes para encantar os clientes de ocasião, não veja a venda coletiva como forma de publicidade e sim como uma forma de capitalização à curto prazo.
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O autor é consultor da IDATI CONSULTORIA E TREINAMENTO